Uma odisséia pessoal até a verdade - Parte I
Por: Judith Reisman
INICIALMENTE,
gostaria de me apresentar de modo a que os leitores soubessem algo
sobre a minha vida e sobre como eu vim a descobrir os procedimentos de
experimentação com crianças de Alfred Kinsey, seus dados falseados, sua
moldagem da moderna educação sexual e da cultura e conduta sexual
ocidental, e também para que saibam como me envolvi em audiências
governamentais internacionais sobre fraudes nas ciências, abuso sexual
de crianças, delinqüência juvenil, pornografia, drogas e outras questões
críticas de nossa época. Tentarei tocar nos pontos da minha vida que
acredito possam ser mais úteis aos leitores deste desmascaramento de
Kinsey.
Nasci em 1935, chamada Judith Ann
Gelernter, em Newark, Nova Jersey. Minha grande e próspera família já
era de uma segunda geração de judeus americanos, de origem russa pelo
lado materno e alemã, pelo lado paterno. Ambos os ramos de avós da
família fugiram da perseguição na Europa, e ao desembarcar em Ellis
Island, Nova York, agradecidamente abraçaram seu país adotivo e
imediatamente aceitaram trabalhos humildes, criando famílias de
realizadores.
Meu pai, Matthew, nasceu em Massachusetts
e minha mãe, Ada, em Nova Jersey. Os Gelernter faziam reuniões de
família, a cada dois ou três meses, numa casa muito grande em South
Orange, Nova Jersey. Mais de quarenta adultos e dúzias de crianças
sentavam-se à mesa para jantares preparados com muito gosto, observando
as maneiras impecavelmente. Sem o advento da televisão, os jantares eram
seguidos de acalorados debates sobre política entre meus pais e o
restante da família. Meus pais eram os radicais da família. Eles
acreditavam na amplamente divulgada propaganda de um mundo novo perfeito
sob o socialismo ou o comunismo. Nenhum de nossos grandes jornais
jamais havia trazido a público o assassinato de muitos milhões de russos
pelo “Tio Joe” Stalin.
Entrementes, meu pai frequentemente fazia
com que eu me lembrasse que “Gelernter” significa “o instruído” em
alemão, um nome de distinção atribuído aos meus antepassados. “Sua vida
deve ser em honra ao seu nome”. Tendo herdado algum talento artístico de
meus pais, o que me proporcionou uma gratificante profissão quando já
adulta, eu deles também herdei o amor pela verdade, a preocupação pelos
impotentes e indefesos e a resistência à tirania, traços que me lançaram
sobre a difícil jornada descrita neste livro.
Vivi numa época maravilhosa. Minha mãe me
dava as boas vindas todos os dias e meu pai me apoiava em tudo que eu
fizesse. Eu estava segura entre vizinhos, tios ou primos, como era comum
à época. Casei-me e o muro de proteção em torno da minha vida resistiu
até 1966, quando minha filha de 10 anos de idade foi molestada por um
garoto de 13 anos, até ali, um amigo adorado e merecedor da confiança da
família. Ela lhe disse que parasse, mas ele insistiu. Ele sabia que ela
iria gostar, disse ele, ele sabia disso do que leu nas revistas Playboy
de seu pai, a única pornografia “aceitável’ naquele tempo. O garoto
deixou o país poucas semanas depois, quando veio à luz o fato de que
minha filha foi apenas uma de várias crianças da vizinhança que ele
tinha estuprado, incluindo o seu próprio irmão menor. Meu coração ficou
despedaçado por todas as famílias envolvidas.
Eu ficaria sabendo mais tarde que este
estarrecedor evento em nossas vidas era um padrão entre os infratores
sexuais juvenis, tal como eles são conhecidos nos círculos policiais e
judiciais.
Eu poderia nunca ter sabido nada a
respeito da violação de minha filha, exceto porque ela caiu em profunda
depressão. Somente após ter prometido não chamar a polícia é que ela
falou sobre o que aconteceu. Depois de lhe assegurar que aquilo não fora
culpa dela, eu telefonei para a minha tia, confiável e séria, que ouviu
compreensivamente e então declarou: “Bem, Judy, ela mesma pode ter
procurado por isso. Crianças são sexuais desde o nascimento”.
Estupefata, eu repliquei dizendo que minha filha não estava buscando
sexo, e então telefonei para Carole, minha amiga de escola, em Berkeley,
que aconselhou: “Bem, Judy, ela mesma pode ter procurado por isso.
Crianças são sexuais desde o nascimento”. Eu fiquei intrigada com essa
locução, usada por duas pessoas tão diferentes e tão distantes
geograficamente. Eu reconheci uma “linha partidária”, ideológica. Eu
ainda não sabia, mas como uma jovem mãe, eu tinha entrado no mundo de
acordo com Kinsey. Eu iria ouvir e ler “crianças são sexuais desde o
nascimento” com bastante frequência. Mas finalmente, eu iria descobrir e
expor as circunstâncias ocultas em torno da sua fonte.
Em 1973 sentei-me na filmoteca da CBS TV
escolhendo o trecho exato do clip da Encyclopaedia Britannica, “Market
Day in Old England”, que eu usaria para o meu próximo vídeo-musical para
crianças. Eu era uma produtora de vídeos-musicais para o programa
“Captain Kangaroo”, o mais querido, confiável e duradouro programa de
televisão para crianças nos Estados Unidos.
Jim Hirschfeld, o produtor de “Captain”,
me colocou para trabalhar logo depois que viu amostras de minhas
produções de vídeos-musicais anteriores, para estações de TV em
Wisconsin, em Ohio, além de outros trabalhos, que incluíam material
educativo para vários museus de arte. Naqueles dias, eu estava muito
preocupada quanto ao modo pelo qual as imagens impactavam no cérebro, no
intelecto e na memória.
Jim era um homem gentil, cortês, e um pai
dedicado, de modo que ele me fez amplas concessões para que eu
trabalhasse a partir de minha casa em Cleveland. Eu gravava num estúdio
local, ilustrava as canções e enviava o produto final para Nova York.
Sem nenhum agente, dependendo apenas do talento que me foi dado por
Deus, eu estava no topo do meu campo de trabalho. Também estava
profundamente impressionada pelo fato de que o sistema americano de
recompensa pelo mérito tivesse tornado isso possível. Então, um dia Jim
chamou-me ao seu escritório e com relutância, mostrou-me um relatório
gerado por computador. Um grupo de teste composto por crianças foi
estudado, usando uma câmera oculta para acompanhar os movimentos de seus
olhos. Jim assegurou-me que, ainda que ele apreciasse muito as minhas
cuidadosas melodias, o anunciante queria os olhos das crianças grudados
na tela da TV. Sem as mães controlando o seletor de canais, as crianças
agora assistiam televisão sozinhas, mudando do “Captain” para desenhos
animados. Eu teria de acelerar o tempo de minhas melodias para competir
com a ação rápida e a crescente violência dos desenhos animados de
outros canais. Bob Keeshan (o “Captain”) ficou aflito com isso, tanto
quanto Jim, mas não tínhamos escolha, disse ele.
Eu me vi sem vontade ou incapaz de
produzir para crianças daquela maneira. Porém, nem tudo estava perdido.
Com os excelentes royalties que recebi do programa, eu poderia voltar à
universidade em busca de um doutorado, estudando os efeitos da mídia de
massa. Tendo passado os últimos quinze anos como esposa de professor
universitário, sabia muito bem tanto da importância que o mundo dava aos
que tivessem o título de doutor, quanto do frequente desapontamento
diante daquilo que eu intimamente considerava falta de curiosidade
intelectual e vigor no meio da comunidade educada. Eu achava as festas e
conversas do corpo docente de alguma forma carentes de um senso comum
básico, e considerando todos os seus títulos, a maioria dos membros da
academia parecia apreciar o distanciamento da realidade da maioria.
Meu trabalho em museus de arte e minha
experiência na televisão deixaram-me preocupada pelo fato de que as
crianças estavam sendo influenciadas, reconfiguradas e verdadeiramente
mudadas, uma vez que imagens e outros estímulos excitantes diariamente
alteravam a estrutura mesma do cérebro da criança receptora. Se um
programa prestigioso e responsável como o “Captain” teve de acelerar seu
formato nos dias de Leave it to Beaver[1],
o que aconteceria nas décadas por vir? Que tipo de crianças a TV estava
moldando e de que forma essas crianças alteradas mudariam nossas
instituições de educação, teologia, governo, direito, medicina, família –
e a própria mídia de massa?
Determinada a obter um doutorado em
comunicação, entrei na Case Western Reserve University, em Cleveland, a
fim de estudar os efeitos da televisão e descobrir, para minha grande
surpresa como uma preocupada profissional da mídia que, por volta de
1972, a toxicidade da televisão já tinha sido bem documentada pelo
relatório do Surgeon General[2] acerca da violência na televisão.
Ao ignorar as descobertas mais duras e
contando que os “guardiões dos portões” não relatariam os fatos, a mídia
de massa descontou e escondeu com sucesso os perigos de sua atividade. O
fato de que já existia um conjunto de pesquisas sobre os efeitos da
televisão, ainda que ignorado, fez com que eu mudasse o foco do meu
trabalho de doutoramento, especialmente depois que testemunhei o que
poderia ser chamado de preocupante experimento não-monitorado de
comportamento verbal versus não-verbal.
Em uma de minhas turmas, um jovem
estudante de comunicação, cuja noiva tinha acabado de deixá-lo, tinha
montado o script de uma produção de vídeo usando fotos explícitas da
Playboy, Penthouse, Hustler e de revistas similares. O Dr. Lowell Lynn, o
professor do curso, assegurou-me que todos os estudantes que estavam
trabalhando na produção deram consentimento prévio ao seu conteúdo. Eles
não tinham “nenhum problema” quanto às fotografias, disse Lynn, e
depois que os risinhos nervosos iniciais diminuíram, o grupo de
estudantes, normalmente vivazes, fechou-se em completo silêncio.
Estranhamente e enquanto nenhuma das fotos de sexo tinha se encaixado
corretamente no vídeo, todas as estudantes trabalhando no projeto, da
diretora à equipe de câmera, negaram verbalmente que as fotos as
perturbassem de qualquer forma. Este foi um surpreendente estudo sobre
descolamento da emoção genuína da realidade, uma vez que as estudantes
estavam obviamente transtornadas pelo tema e conteúdo da produção.
Isto é, elas estavam tão desconfortáveis
que nenhuma delas conseguia assistir aquilo que tinham concordado em
filmar. E ainda assim, cada uma delas negou sua reação e culpou as
outras por “não olharem” para as fotos de sexo. Eu fui embora pensando –
se mulheres e garotas estão sendo expostas a essas imagens mundo afora,
um número significativo de mulheres e garotas, também e
necessariamente, estarão negando emoções e aversões bastante reais.
Essas imagens poderiam causar uma devastação nas delicadas relações entre marido e mulher, pensei.
Uma vez que eu tinha filhas e queria
vê-las felizes e casadas com homens bem ajustados, decidi que eu deveria
examinar melhor o assunto. O ano era 1976. Ainda sem ter nenhuma noção
do papel de Alfred Kinsey na pornografia, nem mesmo o quão exatamente a
pornografia “hard” e “soft” se relacionavam com o abuso sexual de
crianças, eu não tinha a menor idéia de que eu descobriria o quão grave é
esse problema ou de quão profundamente eu me envolveria na tentativa de
resolvê-lo.
Todavia, eu já era capaz de ver as provas
de como a aceitação cultural da visão pornográfica do sexo estava
aumentando as taxas de divórcio e os distúrbios sexuais.
Tradução: Henrique Paul Dmyterko
Tradução: Henrique Paul Dmyterko
NT[1]: Comédia de TV (1957-63), voltada para a família, cujo personagem título, Theodore “Beaver” Cleaver, era um garoto bastante inquisitivo, mas também frequentemente ingênuo.
NT[2]:
Desde 1871, é o principal porta-voz do governo americano em assuntos
relativos à saúde pública. É sempre um oficial de alta patente da
marinha americana e é o chefe do Office of the Surgeon General (OSG).
Leia também: Alfred Kinsey, Pai da pedofilia moderna II
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